Histórias de Abril na primeira pessoa - Notícias - Santa Casa da Misericórdia do Porto

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Histórias de Abril na primeira pessoa
⌚ 25.04.2024
fugas, perigo, mistério e muito mais...

Porque sabemos que nas nossas ERPI - Estruturas Residências para Pessoas Idosas transborda sabedoria, conhecimento e experiência, fruto das diversas e distintas histórias de vida dos clientes que nelas habitam, decidimos lançar um desafio para assinalar os 50 anos do 25 de abril; conhecer histórias da época na primeira pessoa, que tenham marcado os nossos residentes, que há 50 anos viveram um dos momentos mais significativos do nosso estado democrático. 

As histórias que partilharam e decidiram dar a conhecer estão repletas de ingredientes dignos dos melhores enredos policiais; fugas, perigo, mistério e muito mais...

Deixe-se surpreender por duas histórias incríveis na primeira pessoa, de quem, agora já próximo de cumprir um século de existência, viveu abril de 1974 com 46 anos e cujas memórias mantém guardadas e presentes até aos dias de hoje.


O segredo no banco de trás 

"Regressava de Espanha, com a minha mulher e os meus dois filhos,  quando, na Alfândega, fui surpreendido por um amigo, um conhecido que ali trabalhava. Pediu-me, com um tom sério, que desse boleia até Chaves a um agente da PIDE. Concordei, mesmo que a minha vontade fosse dizer que não, um frio gélido subiu pela minha espinha, pois eu, secretamente, era membro do Partido Comunista. No banco de trás, ao lado do membro da PIDE, havia um bolso onde se escondiam uma infinidade de folhetos de propaganda contra o governo. Fui conduzindo, mas o medo apertava-me o peito. Sabia que um olhar descuidado poderia selar o meu destino.

Durante a viagem, forcei uma conversa com o agente, agora meu passageiro, procurando distraí-lo a todo o custo para que não notasse os papéis comprometedores no bolso ao lado. Cada palavra que escapava dos meus lábios era uma tentativa desesperada de manter a sua atenção longe do perigo iminente. O meu coração batia descompassado, como um tambor de guerra, enquanto o suor frio me encharcava as costas. Cada curva da estrada era sentida como um precipício, onde a queda significaria a minha ruína.

O destino aproximava-se, e com ele, o peso do segredo que carregava. O agente da PIDE estava ali, ao meu lado e eu com tantos segredos escondidos, naquele banco de trás. Finalmente, chegamos a Chaves, e um suspiro de alívio escapou dos meus lábios quando ele, finalmente, saiu do carro. Aquela viagem foi um teste de nervos, uma dança perigosa entre a liberdade e a falta dela, onde qualquer passo em falso poderia ter sido o meu último dia de liberdade, ainda que, preso a um regime que não tolerava."


O Café que encobriu uma fuga 

"Um amigo meu  estava a ser perseguido pela PIDE. Desesperado, veio até mim, para que o  ajudasse  a atravessar a fronteira até Espanha. Naquela época, eu residia em Chaves. Disse-me  que depois da fronteira um carro estaria à sua espera do outro lado para levá-lo para longe deste país sufocado pela censura.

Decidi então ajudar. Fui abordar um agente federal responsável pela supervisão da fronteira, mas com o cuidado de não levantar suspeitas. Inventei uma desculpa, disse que tinha uns amigos a visitar Chaves e que gostaria de os levar a um café em Espanha, para que pudessem saborear algo diferente. Num gesto de cortesia, convidei o guarda a juntar-se a nós, mesmo sabendo que ele recusaria por estar de serviço. O objetivo era distraí-lo, desviando a atenção do verdadeiro propósito da nossa travessia.

O agente, alheio às nossas verdadeiras intenções, deixou-nos passar sem suspeitas e lamentando o facto de não ir, por estar de serviço. Foi um alívio imenso quando conseguimos cruzar a fronteira sem sermos detetados. Afinal, estava em jogo a liberdade e a segurança do meu amigo.

Chegados a  Espanha, o carro esperava por ele, pronto para conduzir o fugitivo para longe do alcance opressivo da PIDE. Naquele momento, senti um misto de alívio e gratidão por ter conseguido ajudar. Não sentido qualquer remorso ou culpa. 

O café bebi-o sozinho, mas acompanhado de um sentimento de liberdade."


Obrigado por tão bem guardar estas memórias e pela generosidade de as partilhar!


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